domingo, 4 de abril de 2010

Sobre Ser e Escutar


Sei que é aqui que você vem para ler-me. Que aqui busca o entender, o compreender, o aceitar. Aqui busca algo que te faça me decifrar, este ser gangorra de emoções. Este ser que aqui está.
Sim, é aqui que eu venho para me rasgar. Mas é também aqui que falo o que é preciso para te machucar.
Não, não quero ferida profunda. Quero ferida que rompa a superfície e te faça falar. Falar para mim, sem metáforas. Falar, falar, falar...
Mas este sou eu. Este que fala sem parar sou eu. Você é o outro, o que cala, o que deixa pra lá. Mas e daí, que novidade há de subverter agora depois de tanta coisa devidamente adequada?
Nada deveria surpreender.
E então você fala. E sou eu quem assume o calar. Tenho medo do que pode me acontecer, medo do que irei escutar. Logo eu que quero sufocar esse teu silêncio cheio de palavras. Logo eu que ora é isso e ora nada. Sim, sou eu que tenho terror de te escutar.
E eu, gangorra de emoções, deixo-te só. Como marinheiro que navega em mar remoto, em maremoto. E você, coitado, só, fica ali, a me decifrar, a se adaptar.
E eu que sou tudo, esse montão, fico lá. Aguardando seu barco estabilizar. Egoísta, deixo você na minha onda. Não consigo te olhar.
Meus olhos dizem muito. Prefiro adentrar-me, prefiro te evitar. E você sente, sei que sente. Eu sinto, mas não cuido. Deixo estar. Sou eu quem deixo estar.
E você fala. É verdade, é o que pensa, não é pesado. O peso sou eu quem dá. Não, não é culpa sua, por favor, não deixa de se expressar. Eu é que talvez não saiba escutar. É, eu não sei escutar. Eu que me defendo de tudo. Eu que amo argumentar. Eu, da natureza do convencer. Eu e isso tudo, é de família, sei lá!
Porém, sigo eu com meus olhos de vampiro, evito teus olhos para neles não me espelhar. E tenho medo das tuas palavras. Elas não são baladas, são razão, lucidez e defesa.
"É preciso me preparar. Para não ser pego de surpresa." E o que mais eu posso falar? Eu que achava que estava tudo bem, eu que pensei até em casar, em casa?! Meu Deus, é de desesperar! Não o que você me diz, mas o que eu posso esperar de mim e do meu fim.
Sim, acho que você está errado! Mas sei lá, o que eu afinal posso achar. A gente não conversa. A gente não fala. Cada um acha o que deve achar.
Aí vem você vem aqui, me lê e eu fico a esperar. Suas palavras ditas, para eu mal-interpretar, seu olhar escondendo pensamentos, seu autismo milenar.
Mas a culpa não é sua. Sou eu que não aprendi a me controlar. Sou eu que agora não sei o que pensar!
Desculpa, se é que é preciso pedí-las. Culpas, se é que é preciso sentí-las. Ai, quanta tontura! Eis a terrível dor do dialogar.

Escrito em 04/03/10 (Desenho da mesma data)

2 comentários:

  1. Nossa quantas duvidas giram sobre o ser humano ?
    o texto ta perfeito e o sentimento proposto em dialogar ,sem explicação.
    é tão gostoso ler e tentar entender os seus textos !
    I love you !

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  2. Adorei o texto. Gostoso de se ler e imaginar! Estarei dando voltinhas por aqui de vez enquando pra "te ler" bjks!!

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